Ouvidos não têm pálpebras. Essa idéia surge na obra do educador musical canadense Murray Shafer e nos leva à surpreendente conclusão de que estamos vulneráveis a todos os tipos de som. Convivemos com a poluição sonora sem ter consciência dela. As iniciativas de musicalização hoje propostas em muitas escolas de educação infantil e ensino fundamental surgem, a partir dessa premissa, como um processo de apoio não só a projetos pedagógicos, mas ao desenvolvimento da escuta pela criança.
“A criança deve ser agente. Precisa ter canais de percepção abertos para entender os elementos da música, avaliá-los de forma crítica, produzir música e se comunicar através dessa linguagem”, afirma a professora Denise Ursine, do Colégio Sagrado Coração de Maria, em Belo Horizonte/MG. Esse trabalho, avalia, mais que propor uma forma de linguagem, tem inúmeros resultados também na formação cultural, no convívio social e no desenvolvimento sensório-motor dos pequenos.
Primeiros sons
O primeiro sentido a se desenvolver no bebê, ainda no útero, é a audição. E o primeiro aprendizado é a escuta do coração da mãe. A partir do quinto mês de gestação, o bebê já percebe sons externos e reage a eles. Depois do nascimento, as paisagens sonoras se multiplicam. “Não impomos barreiras aos sons que ouvimos, eles nos atingem imediatamente”, diz Denise.
Nos primeiros anos de vida, a criança começa a estabelecer relações com os sons e, através de atividades de discriminação, desenvolve o que a professora chama de “ouvido pensante”. “Não é só cantar musiquinhas, é um trabalho de descoberta e questionamento.” Segundo ela, a valorização da iniciação musical na educação infantil oferece às crianças novas ferramentas para lidar com o mundo.
Ela observa que, na Grécia antiga, a música desempenhava importante papel na formação do caráter e da personalidade das crianças desde o início da infância, fazendo parte da educação formal. Mas a opção pelo aprendizado de um instrumento musical, afirma, não acontece necessariamente na escola e deve ser precedida por um processo de desenvolvimento da escuta. Só depois de conhecer elementos de som, ritmo, melodia e harmonia, a criança poderá escolher um instrumento com maior consciência de seus interesses, afinidades e habilidades, o que vai acontecer por volta dos cinco anos.
Música em casa
Permitir às crianças ouvir todo tipo de música é fundamental, assim como conversar com elas sobre o assunto, participar de suas brincadeiras e imitações. “É muito importante valorizar o que a criança faz e oportunizar o fazer”, afirma a professora. Comprar CDs de música infantil para os filhos e estimular seu contato com objetos sonoros faz parte desse processo.
Isso vai facilitar e promover comunicação, relacionamento, aprendizado, expressão e organização. “Os fundamentos da música estão na natureza, na harmonia. É sempre um contato que transcende.”
[ + ] Fonte: Revista Alô Bebê